Centros culturais: espaço para a arte popular

Centros Culturais: uma tentativa constante de descentralização da cultura

Os Centros Culturais, criados para atender as demandas das comunidades, hoje vivem uma nova fase, a de mostrar que cultura não é apenas arte, mas reflexão política. Mesmo tentando sanar dificuldades que vão das verbas a falta de participação popular formal, estes espaços mostram a importância que tem para a cidade.

Em 1992, Belo Horizonte inaugurou seu primeiro Centro Cultural, o Lagoa do Nado, na Regional Norte da capital. A idéia de construir estes espaços na cidade nasceu a partir de uma discussão de descentralização cultural, iniciada no final da década de 1980, quando foi criada a Secretaria Municipal de Cultura. “Começamos a desenhar uma política mais democrática para atender a diversidade cultural da cidade”, explica Abilde Carneiro, chefe do Departamento de Coordenação dos Centros Culturais da Fundação de Cultura de BH.
A partir do artigo 166, do Capítulo da Cultura da Lei Orgânica do Município, promulgada em 1990, os movimentos culturais expandiram a discussão sobre a implantação de espaços em diversas regiões. O objetivo era ampliar o acesso da periferia aos equipamentos públicos, pois até então o único equipamento municipal de cultural era o Museu da Pampulha.
Hoje, quatorze anos após o surgimento do primeiro Centro Cultural, Belo Horizonte tem, ao todo, quatorze equipamentos culturais aprovados pelo orçamento participativo. Deste total, três estão funcionando:Centro Cultural Alto Vera Cruz, Centro Cultural Pampulha e Centro Cultural São Bernardo; oito ainda não tiveram as obras iniciadas e três estão com ordem de serviço assinada. A previsão é que, ainda no próximo mês, Venda Nova, Vila Marçola e Regina/Lindéia começem a ser construídos. Os demais foram aprovados, mas ainda não há previsão de início da construção. São eles Centro Cultural Santa Tereza, Centro Cultural do Urucuia/ASCA, Centro Cultural Padre Eustáquio, Centro Cultural Vila Fátima, Centro Cultural Salgado Filho, Centro Cultural São Geraldo e Adjacências, Centro Cultural do Jardim Guanabara e Centro Cultural Vila Santa Rita. Os Centros Culturais Zilah Spósito, Centro de Cultura Belo Horizonte, Lagoa do Nado e Centro Cultural Liberalino Alves de Oliveira foram implantados com recursos diretos da prefeitura.
A construção de Centros de Cultura foi a primeira demanda cultural do OP e surgiu logo na discussão do segundo centro cultural da cidade, o do Alto Vera Cruz. “O Centro Cultural Alto Vera Cruz (CCAVC) tem particularidade fantástica, por causa do estrangulamento social, a comunidade abraçou esta prioridade no orçamento”, relata Abilde Carneiro. “A partir do CCAVC as demandas no OP começam a ampliar”, completa.
Entre 2001 e 2004, os centros culturais ficaram sob a responsabilidade das regionais, como uma tentativa da Secretaria Municipal de Cultura de fortalecer a descentralização geral da administração do município. Hoje, novamente sob a gerência da Fundação Municipal de Cultura, seguem as diretrizes da instituição. A fundação avalia o momento em que os centros eram subordinados as regionais como uma oportunidade de diagnóstico do que realmente precisava ser feito. “Constatou-se que ao mesmo tempo em que a descentralização fortaleceu as regionais deu a elas responsabilidades demais, que elas não deram conta de cumprir. A política cultural estava começando a se descentralizar, estava sendo gestada”, diz Bernardo da Mata Machado, atual Diretor Especial de Equipamentos Culturais da Fundação.

Um espaço para produzir cultura
Uma das propostas dos centros é oferecer as comunidades um espaço de formação para cidadania e condições para a produção cultural e o fazer artístico. No entanto, apesar da importância incontestável destes locais, ainda existe muito a ser feito. “A casa ainda não está pronta. Quando pensamos no Orçamento participativo não basta apenas construir uma casa de qualquer jeito. Eu tenho que fazer uma casa que tem um bom som, uma boa iluminação, um bom acesso”, diz Lindalva Macedo, coordenadora do Centro Cultural do Alto Vera Cruz.
Marcos Donizetti, integrante do grupo de rap Artilharia Pesada, do Alto Vera Cruz, diz que para que os centros culturais cumpram plenamente sua proposta é preciso algumas readequações. “O centro cultural é um espaço interessante, apesar de faltar alguns equipamentos e capacitação para os grupos culturais utilizá-los. Muitas vezes os grupos não entendem a proposta dos centros. Muitas vezes utilizam estes lugares apenas como espaço para ensaio”, avalia o rapper. Ele afirma que uma das maiores dificuldades do Artilharia Pesada, por exemplo, é a falta de alguns equipamentos, como microfone para ensaiar.
A divulgação das ações dos centros culturais é um gargalo apontado tanto pela gestão dos centros, quanto pelos próprios grupos. De acordo com Lindalva Macedo, tem pessoas do Alto Vera Cruz que não conhecem o Centro Cultural. “Divulgar cultura é uma política. Tem muita gente na região que não conhece o CCAVC, apesar do espaço ser freqüentado por pessoas do Taquaril, Granja de Freitas, Saudade e até São Geraldo”. Marco Donizetti, partilha da mesma opinião e acrescenta “Os próprios grupos que estão há mais tempo envolvidos com os centros culturais tem esta obrigação”.
De toda forma, divulgação requer preparativos para receber a demanda e a coordenadora do Centro Cultural Alto Vera Cruz diz que a prefeitura tem consciência da necessidade de algumas reformas. “A própria prefeitura está readequando o Centro Cultural. Isso faz parte das nossas ações políticas. A prefeitura está preocupada sim. Muita coisa aqui já melhorou. Estas readequações são possíveis e urgentes, mas é um processo, não acontece da noite para o dia” explica Lindalva.

A participação popular, apesar de ser uma mola propulsora, ainda é uma ação informal
Apesar de ser uma demanda dos movimentos sociais e das próprias comunidades, a participação popular na gestão dos centros ainda é incipiente. “Ainda é pequena a participação popular na gestão dos centros. Precisa melhorar muito. Na última conferência de cultura, a criação de um conselho ficou muito presente. A juventude organizada também tem falado muito nisto”, avalia Lindalva Macedo.
A Fundação Municipal de Cultura revela que esta participação não é mesmo formal e nem oficial. Ainda hoje, quase uma década e meia após a criação do primeiro centro cultural ainda não existe um Conselho Popular oficial. “Entendemos que a gerência administrativa é do município, mas a gestão tem que ser o mais participativa possível”, admite.”Inicialmente, na Lagoa do Nado, existia uma comissão consultiva. Praticamente todos os centros culturais tinham Fóruns informais, mas perdemos um pouco este mecanismo de participação, a partir de 2001 quando os centros culturais foram para a responsabilidade das regionais”, explica.
Para o antropólogo e doutor em Comunicação e Cultura, José Márcio Barros, apenas o consumo do produto não configura participação popular. “A participação popular na gestão de espaços públicos só acontece se você tem estruturas formais de co-gestão. As comunidades locais não participam da gestão dos espaços públicos de cultura porque não existem conselhos. Não havendo conselhos, tudo se reduz a uma parceira”, analisa.

Descentralização em expansão
Reinaldo Santana, do grupo Vozes do Rap, conta que não só os grupos culturais, mas a comunidade da Serra abraçou a luta pela construção de um centro cultural. Através do levantamento de dados, realizado em 2003 para elaboração do Guia Cultural de Vilas e Favelas, foram analisadas as condições em que os artistas da comunidade trabalhavam e diagnosticou-se uma demanda por um espaço que servisse para a troca de experiências e a interlocução entre os artistas. Para os representantes do Criarte, coletivo artístico do Aglomerado da Serra, a aprovação do Centro Cultural da Vila Marçola no OP é fruto do esforço da comunidade pela ampliação do exercício da cidadania e do direito a arte a informação.

A Polêmica do Diagnóstico
Alguns grupos acreditam que os Centros Culturais deveriam ouvir mais as comunidades. “Ainda falta uma discussão com os grupos para ver a dificuldade deles, ainda falta este diálogo”, diz o vocalista do Artilharia Pesada. Lindalva, do Centro Cultural Alto Vera Cruz conta que este diálogo existe e que ele é processual. “Nós escutamos a população para que as ações sejam um retrato do que ela quer. Os grupos culturais e a biblioteca apontam para nós as demandas”, diz Lindalva. “Havia uma comissão gestora atuante desde a implantação do Centro cultural que facilitava o diálogo entre a comunidade e a gestão do CCAVC. A comissão era formada pelos grupos culturais”, conta Alcides Pereira de Souza, membro do Centro de Ação Comunitária do Alto Vera Cruz. “Existe uma certa burocracia no atendimento do Centro Cultural às demandas, o que dificulta a realização das aspirações, dos sonhos que mobilizaram o Alto Vera Cruz a lutar por um centro cultural”, termina.
José Márcio Barros explica que o diagnóstico participativo é um processo realizado tanto junto aos sujeitos que participam quanto junto aos outros, que não participam ou se envolvem com determinada realidade. “Fazer apenas reuniões com a comunidade é reduzir demais o conceito de participação”, avalia.
“Ao longo de dez anos, ainda não chegamos a oferecer para a população talvez o que ela mais queira, por exemplo, na área do samba e do pagode, lamenta Lindalva. De acordo com ela, este tipo de dificuldade surge muito em função da aproximação que o grupo faz do espaço. “Muito importante numa gestão é um relacionamento com os grupos culturais organizados. Não basta apenas ser grupo cultural, tem que estar organizado para colocar suas demandas”, ressalta a coordenadora do grupo.
A Fundação de Cultura diz que não existe espaço específico para colocação das demandas da comunidade, mas que elas são coletadas e absorvidas pelos centros culturais no decorrer do tempo, “Ainda não existe um momento pontual para o diagnóstico, ele se dá no cotidiano. Os centros estão muito integrados nos locais onde estão instalados Talvez num futuro caminhemos para uma formalização disto”, revela Bernardo da Mata Machado. Ele diz ainda que na hora de propor as ações existe a participação de todos os envolvidos. “Há um movimento duplo, a sociedade empurra o poder público e ele responde. Em determinados momentos ele é o proponente e em outros é a sociedade”, explica.

Projeto Olhares sobre Belo Horizonte
Olhares sobre Belo Horizonte: os centros culturais e seu lugar na cultura da cidade, é um projeto iniciado em fevereiro de 2006 que vai até o fim do primeiro semestre. A iniciativa promove a descentralização cultural através de atividades realizadas nos Centros Culturais Alto Vera Cruz, Liberalino Alves de Oliveira, Zilah Spósito, Pampulha e São Bernardo, oferecendo programação gratuita. Um dos objetivos é a revitalização dos Centros Culturais promovendo diversas atividades, incluindo oficinas, shows musicais, espetáculos teatrais, circo, dança, mostras de cinema, utilização de bibliotecas, palestras e seminários.
O projeto abrange dois eixos temáticos: o da formação cultural e o de identificação. Dentro do projeto existem ainda duas outras ações: incentivo à leitura e reflexão; difusão e intercâmbio cultural. “O Projeto Olhares aponta na direção de que a cultura não é só dançar cantar e interpretar, ela passa pela reflexão, pela leitura, é uma somatória de ações o projeto”, diz Denisia Martins Borba, técnica da Fundação Municipal de Cultura.

Centros Culturais
O Centro Cultural Alto Vera Cruz (CCAVC) foi criado em 1996, com verba aprovada pelo Orçamento Participativo de 1995. Promove cursos, oficinas, eventos, debates, seminários, encontros e palestras e dispõe de uma biblioteca, voltada especificamente ao público infanto-juvenil.
Endereço: Rua Padre Júlio Maria, 1577 – B. Alto Vera Cruz
Tel: (31) 3277-5612
Horário: 2a a 6a feira, das 9 às 19 horas
Ônibus: 9407 e 9503
E-mail: ccavc@pbh.gov.br

Centro Cultural São Bernardo
Em 1994, através de parceria entre a Administração Regional Norte e a Secretaria Municipal de Cultura foi inaugurado o Centro Cultural São Bernardo, atendendo às reivindicações da comunidade, que desejava ter um espaço cultural. Hoje é um espaço de referência para os moradores da região, realizando atividades como: cursos, oficinas, palestras, debates, apresentações artísticas e incentivo à leitura.
Endereço: Rua Padre Júlio Maria, 1577 – B. Alto Vera Cruz
Tel: (31) 3277-5612, falar com Maria José – diretora / Horário: 2a a 6a feira, das 9 às 19 horas
Ônibus: 9407 e 9503 / E-mail: ccavc@pbh.gov.br

Centro Cultural Conjunto Zilah Spósito
Foi inaugurado em outubro de 2000, cinco anos após pesquisa que identificou a demanda da comunidade por um local destinado à realização de atividades culturais. Mas em 1993 já eram feitos alguns projetos para atender a demanda da população local, com apoio da URBEL e da Administração Regional Norte. Hoje o espaço oferece sala multimeios, biblioteca e oficinas.
Endereço: Rua Carnaúba, 286 – B. Jaqueline
Tel: (31) 3277-5498, falar com Elisabeth – diretora / Ônibus: 5534
Horário: 3a a 6a feira, das 8 às 17 horas; sábado e domingo, das 9 às 13 horas

Centro Cultural Lagoa do Nado
Inaugurado em 1992, O Centro Cultural Lagoa do Nado localiza-se numa área verde de 300.000 m². O Centro Cultural nasceu a partir da mobilização da população, que desejava a preservação da área da fazenda, que daria lugar a um condomínio. O espaço hoje oferece oficinas, cursos, palestras, debates e apresentações artísticas.
Endereço: Rua Hermenegildo de Barros, 904, B. Itapoã
Tel: 3277-7420, falar com Elke – diretora / Horário: 3a a 6a feira, das 8 às 17 horas; sábado e domingo, feriados das 9 às 17h / E-mail: cciln@pbh.gov.br
Ônibus:Todos que passam na Av. Pedro I

Centro Cultural Liberalino Alves de Oliveira
Endereço: Rua Araribá, 975 – pilotis – Bairro São Cristóvão
Tel: 3277-6077, falar com Maria Eliseth (Elisa) – diretora / Horário: Seg a sex – 8 as 17h, Sab de 8 as 13h e Dom: 9 a 12h / E-mail: cclao.fmc@pbh.gov.br
Ônibus: 4106 / 420